quarta-feira, 16 de abril de 2025

MEU FINADO PAI

Faço uma postagem, agora, dando margem para alguém dizer que ela seria ideal na época do dia dos pais - só que sou desorganizado, não me sinto nada bem tendo que  ficar preparando a postagem específica para ser blogada em data tal. Até penso que nesses períodos comemorativos fica muito conteúdo de todo mundo, então não quero colocar mais do mesmo, não quero ser mais um peixinho nesse cardume. 

Quando eu tinha o antigo Socializando, não via problema nenhum em postar os gibis que eu gostava, mesmo que ali eu falasse em uma história de Natal e estivéssemos em Julho, por exemplo. Eu acho estranho que minha pessoa desempregada - sem vínculo contratual com empresa nenhuma, serviço nenhum e pessoa nenhuma -, tenha que se submeter a essas convenções a troco de nada. Acho chato que você, agora, deve estar pensando em como me sustento, mas  acharia muito legal se você me enviasse um pix de qualquer valor para caldeirafabiano777@gmail.com ou caldeirafabiano33@gmail.com.

Hoje quero falar sobre meu pai. O Sr. Antonio Caldeira, filho da Sra. Rita Ravagnani Caldeira e marido de minha mãe: Maria Shirlei Espresola Caldeira. Não conheci meus dois avôs. Morreram antes de eu ter consciência de que era gente. Nem sei do quê. Acho que já me contaram algumas vezes, mas minha mente insiste em bloquear (talvez eu seja uma reencarnação de um deles, vá saber). 

Meu pai sempre foi severo conosco (severo, não violento!). Eu e minha irmã temos 3 anos de diferença, então crescemos participando da vida um do outro. Meu pai teve um bom trabalho em uma metalúrgica, o que não era nada fácil, mas ele tinha sorte em conquistar a confiança dos grandes, então, com o passar do tempo, tornou-se chefe em um dos setores mais importantes, mas isso foi algo conquistado durante muitos árduos anos em que tinha de ser forte, pontual e disponível até mesmo em muitas horas extras e viagens (poucas, na verdade, bem poucas, mas aconteceram). Os caras o chamavam de puxa-saco. Quem dera. Eu já trabalhei com ele, exatamente lá, e eu vi muito bem quem eram os tais puxa-sacos, os caras eram verdadeiras cobras traiçoeiras, mas tinha muita gente boa lá. Em um barracão com cerca de quinhentos homens, não era de se estranhar que houvesse gente de tudo que era jeito. Eu não fiquei mais do que quatro anos lá, mas meu pai fez carreira e se aposentou - largou o trampo, mesmo com os patrões implorando para que continuasse. 

A vida fez do meu pai uma pessoa rígida. A educação masculina daquela época era a de que homem não chorava. Aliás, homem não podia mostrar sentimento nenhum que não fosse relacionado aos bens que conquistava e ao amor pela sua mulher. Isso fez dele um homem que não sabia se comover, se expressar sentimentalmente. Mesmo nos últimos tempos, com seus 74 - ou 75? não sei -, em que ele se permitia ser mais descontraído e leve, era automático que o sentimentalismo não fazia parte de sua personalidade. Um exemplo:

Roubaram seu carro - pouco tempo antes de ele ir morar com Deus -, a gente sabia que aquele golzinho caramelo pálido era um mimo glorioso na vida dele. Eu passei boa parte da noite surtando em orações gritantes "Hosana Nas Alturas", em decretos e mentalizações com vela e um insenso atrás do outro, uma loucura que é dífícil de explicar, mas o lance era focar em uma concentração muito grande de energia focada no pedido de que encontrassem o bendido automóvel. Minha irmã, mais prática e com os pés no chão naquela época, preferiu falar com um certo mano que era muito chegado ao meu pai, porque meu pai o considerava como um filho e ajudava ele no bar e blá-blá-blá. O fato era, o roubo do carro havia abalado a gente, pois sabíamos que, àquela altura do campenato, meu pai doente não merecia passar por aquilo. Então era lógico que o coroa estava em mil pedaços, mas ele agia como se nem ligasse. Era estranho vê-lo pela casa em um conformismo que chegava a me incomodar. Em um momento, fui tocar no assunto, querendo expressar meu sentimento de comoção, minha solidariedade, e levei um baita coice que nem um cavalão de verdade conseguiria me dar. Tive vontade de xingá-lo e ir chorar em minha casa, mas aguentei o rojão e engoli o sapão. Mesmo naquela ocasião, o velho fazia questão de ser durão, e "ai" de quem viesse falar algo para fazê-lo sentir-se melhor. Não se sabe como, o tal mano do coração (como se fosse membro da família, só que não) deu notícias após um tempo o qual consideramos uma eternidade, dizendo que um amigo do amigo tinha visto o carro não sei aonde. Meu pai, pegou meu cunhado e virou um tiro até o lugar. Voltou todo realizado, todo bobo, com o gol de volta. Teve que mandar arrumar algumas coisas, mas essa ocupação até que fez bem para os dias monótonos que ele vinha tendo. Para quem agia com indiferença, era notório que meu pai tinha recuperado a alegria de viver - pena que não viveu muito após aquele período.

Ele se foi no dia 20 de Dezembro de 2018, fiquei sabendo na madrugada, antes de começar o terço da misericórdia no canal Canção Nova, que eu aguardava para pedir por ele. Muitas horas antes, eu tinha discutido com minha irmã, porque ela tinha autorizado os médicos a não reanimá-lo se sofresse uma parada cardíaca. Hoje entendo que fiz mal, pois o que ele duraria a mais, sendo bastante otimista, seriam uns dois dias - isso já esperando algo surrreal. Plantei nela uma culpa que não existe. Eu sou bom nessas coisas.

"A gente tem que entender a vontade de Deus", ela se defendeu.

"Só que não foi a vontade de Deus. Foi a sua vontade. O medico não perguntou pra Deus. Ele perguntou pra você.", o silêncio súbito dela me fez perceber o estrago, mas a merda já tinha saído. Não dá pra enfiar de volta a bosta no cu.

No fim das contas, acho que eu mereço a droga de vida que eu tenho, pois eu não sou bom. Se eu tivesse maior poder aquisitivo, acho que faria coisas desprezíveis, pois não me importo tanto com pessoas que me fazem sentir mal. É mais fácil me importar com gente estranha, gente distante, a alguém perto que me conheça.

Mas eu não estou lamentando. Ser ciente dessa natureza não é um lamento nem vitimização. É só uma constatação. A vida nunca foi boa comigo, e acho, sim, que muita gente tem sua parcela nisso, não vou carregar meus pesos sozinho. Aliás, eu não deveria carregar peso nenhum. Tento me convencer disso.

Voltando ao foco, para terminar, deixo registrado o último almoço de dia dos pais, quando ele ainda estava muito bem a ponto de nos enganarmos de que ele continuaria conosco por mais alguns anos. Fomos almoçar em um restaurante chamado Maria Pimenta, um bom espaço em um dos melhores lugares de ricos na cidade. Estava lotado e com música ao vivo - um cara sentado com uma viola cantava alguns clássicos da música brasileira. Lembrava um cowboy, mas a voz aveludada demais denunciava que era o cantor padrão de barzinhos que tanto se vê por aí, mas sabia muitas canções: Tião Carreiro & Pardinho, Milionário & José Rico, Chitãozinho & Xororó etc. O cantor dizia que atendia pedidos, então meu pai teve o ímpeto de ir até lá e pediu a música PAI, do Fábio Júnior. Não, meu pai não gostava do Fábio Júnior, mas a música PAI fazia ele pegar o cantor no colo, se precisasse. O homem pediu desculpas ao dizer que infelizmente não sabia a letra daquela música. Meu pai voltou para a mesa, eu acho, decepcionado. Aparentemente estava tudo bem, ele aproveitou o momento, mas fiquei chateado porque eu penso o seguinte: é almoço do dia dos pais, caralho! Como contratam um cantor para cantar no dias dos pais e esse cantor não conhece a música PAI? Que raio de cantor é esse? 

Foi um bom almoço. Tivemos um período bom depois, até que as coisas foram se complicando. Hoje é minha mãe quem está em tratamento. Ela está bem até demais. Mimada por muita gente, paparicada, ganha presentes, ganha até comida (ela não precisa!), mas não me engano, pois ninguém é Highlander. Minha irmã faz muito por ela, eu devo reconhecer. Para quem vivia feito cão e gato, até que as coisas amansaram um pouco - só um pouco, o suficiente para considerar a evolução dos dois Pokémons. Atribuo, sim, essa "melhora" ao fato de ela e meu cunhado estarem frequentando o centro espírita. Sempre tiveram um apreço por Kardec, agora resolveram frequentar o centro e se envolver um pouco mais. Uma doença grave sempre mexe, né? O fato de estarem tão próximas sempre opera alguma diferença. Hoje veem juntas a novela turca "Força de Mulher", que durante muito tempo mostrava como era difícil a mãe doente lidar com seus filhos pequenos na ausência do pai. A novela já mudou bastante o enredo, mas conquistou a gente aquele elenco, aquelas crianças, é um povo turco que nos faz lembrar de muita coisa dos tempos em que a vida era diferente, por isso rolou uma certa identificação. Logo ficaremos órfãos dessa novela. Ah, Ah!

Um abraço para quem ficou até aqui. Estou esperando meu pix! Ah, Ah! 

Meu pai e minha mãe

Minha irmá e meu cunhado

O almoço do dia dos pais

15 comentários:

  1. Cantor de bares e restaurantes que desconhece PAI!!! Pqp.
    Belo relato. Seu pai foi um homem honesto, digno, fruto de seu tempo, que viveu em função sa esposa e filhos. Isso acabou daqui pra frente.
    Eu já conhecia as histórias narradas por vc, aqui, e vc sabe o q acho sobre tudo.
    Abraços!

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    1. Sim, esse modelo de homem patriarcal acabou. falam tanto do tal do amor excessivamente fofo e romantizado, que conseguiram acabar com os relacionamentos de verdade onde se tinham filhos educados sob um casamento, por vezes, arranjado. As pessoas não querem saber de tolerar, compreender, muito menos se sacrificar e abrir mão de coisas em nome da tradicional família brasileira. Estamos em outros tempos.
      Um abraço ☕️❤️

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    2. Belo texto. Acho uma desgraça que hoje o homem patriarcal seja algo a ser exterminado, cancelado, todo mundo tem que ser frouxo, todo mundo tem que ser levezinho, descompromissado de tudo, uma merda isso.
      É só um palpite, um chute, mas talvez essa dificuldade que diz ter de se preocupar ou, pelo menos, demonstrar preocupação pelos que lhe são mais próximos seja uma herança de seu pai, em parte genética mesmo e em parte pela maneira com a qual ele te educou.
      E o cara não saber cantar Pai no dia dos pais é de cagar, mesmo.

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    3. O homem era configurado a prezar sempre por sua família em primeiro lugar, antes até de si. Era um cavalo de batalha para criar e edificar seu lar. Nasceu homem, já era criado para crescer varão, forte, determinado, sem dores e com ofício de se preparar para o trabalho, pois logo teria mulher e filhos para sustentar, sua casa, seu carro. E antigamente muitos conseguiam ter casa e carro. Era tão automático, isso, que os homens que não seguiam esses padrões costumavam ter conflitos. Estamos em tenpos onde os homens estão livres dessa coisas, não precisam mais crescer com essas expectativas sobre si. É melhor hoje? Para mim, é sim. Para o povo de hoje, também. Mas será que para a sociedade que vivia com o ciclo da famílias sempre se renovando geração após geração, movimentando a economia, será que isso é bom? Muita coisa já está diferente e muito ainda se mudará. Para melhor e para pior. Isso depende muito de pessoa para pessoa, em alguns aspectos. Politicamente falando, haverá de se repensar na estrutura econômica social.
      Obrigado, macho das antigas, pelo seu comentário. Sua espécie está entrando em extinção

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    4. "Sua espécie está entrando em extinção"

      Já entrou, felizmente.

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    5. Olha... talvez não. Talvez esteja vindo o novo macho provedor e senhor de sua família, mas agora com mulheres empoderadas em vez de submissas. Elas querem o homem provedor, que proporcione segurança a elas e a família. Nem tudo está perdido em relação a isso.

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  2. Fabiano,
    Que narrativa fantástica e rica.
    Como publiquei no Espelhando,
    somos nós que devemos
    contar nossa história
    com todos os ingredientes,
    assim por dizer. E vc o faz
    lindamente.
    A vida é difícil? Sim é,
    especialmente para
    quem não doura pirulas ou
    faz de conta, mas nem
    por isso a vida é ruim
    ou feia. A vida é como diz
    o Nelson Rodrigues:
    É como ela é.E vc sabe ser
    realista sem perder
    doçura.
    E penso que publicarmos fora das
    datas padrões, dá mais sentido e
    conseguimos ao ler,
    refletir melhor e com calma.
    Dentro da data, fica malhando
    ferro frio, nem
    faz sentido de tanto
    que rodo mundo fala no assunto.
    Força pra sua Mãe e pra Vc e sua Irmã.
    Adorei ler, mas Vou ficar te devendo o
    PIX, pq as coisas andam
    apertadas pra mim.
    Tá bão?
    Bjins
    CatiahôAlc.

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    Respostas
    1. Sim, a vida é o que é. Eu não acho que tenho doçura em nada, mas já ouvi algumas vezes algo desse tipo, então deve ser verdade.
      Que bom que você também não se apega tanto às publicações tendo que ser feitas em datas comemorativas. É bem isso que você falou.
      Minha mãe está bem e vai ficar bem. Estou certo disso. Mas ela já tem mais de 70 anos. Quando a gente chega nessa idade, sempre tem que lidar com dor aqui, dor ali, coisas mil que vão aparecendo.
      Sobre o Pix, estamos no mesmo barco. Eu coloco, sim, porque facilita quando alguém pode dar um incentivo, mas não vejo necessidade de ficar sempre divulgando, pois fica uma coisa muito chata. De repente, alguém sempre apoia. Eu tenho quatro canais no Youtube, abasteço de conteúdo minhas redes sociais, escrevo ebooks que coloco na Amazon, então o Pix não deve ser encarado como uma caridade, mas, sim, o apoio em reconhecimento ao que faço.
      Um grande abraço ☕️❤️

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  3. Também não dou bola pra datas. Nem meu aniversário eu comemoro. Nas redes ninguém sabe quando eu aniversario porque buguei a data...rs
    Todo mundo tem histórias de família. Em todas elas há momentos felizes, há momentos dolorosos, há momentos de tensão. Normal, o bom é que na média, seja uma vida boa. Vou legal ler parte da sua história, eu gosto desses textos mais pessoais.

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  4. "ou legal ler parte da sua história", corrigindo, "Foi legal ler parte da sua história..."

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  5. Respostas
    1. Obrigado, um abraço para você também, querida

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    2. Ei Fabiano!
      Passando para deixar
      Com Versos
      Renascimento

      Que todo dia seja dia de Renascer
      Para florescer e perfumar para Depois
      Deixar sementes para um Amanhã
      Mesmo que não estejamos nele para a Colheita

      Bjins
      CatiahôAlc.

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